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O sector dos materiais naturais e reciclados está a crescer e o potencial destes materiais em várias vertentes pode ser demonstrado, como verifica o projecto ReNaturalNZEB, um consórcio luso-espanhol que envolve o LNEG e o ITeCons. No entanto, Paula Duarte, coordenadora da iniciativa no LNEG, diz que a “procura ainda não está a puxar a oferta” e que o mercado ainda tem de amadurecer.

“Existe uma grande dificuldade por parte dos projectistas, arquitectos, empreiteiros e instaladores, de encarar os materiais naturais e reciclados como uma opção viável para a construção sustentável”, declara Paula Duarte, investigadora do LNEG – Laboratório Nacional de Energia e Geologia. Isto acontece ao mesmo tempo que o mercado dos materiais naturais e reciclados está “em crescimento”, com empresas fornecedoras a demonstrarem interesse pelo tema, sobretudo, a nível da cortiça e da madeira. No entanto, “a procura ainda não está a puxar a oferta” e o mercado ainda não está “amadurecido suficientemente”.

A constatação decorre de um projecto de investigação que envolve o LNEG, o ITeCons – Instituto de Investigação e Desenvolvimento Tecnológico para a Construção, Energia, Ambiente e Sustentabilidade, e mais cinco instituições espanholas parceiras, nomeadamente CICYTEX, INTROMAC, URVIPEXSA, Universidade de Córdoba e, como entidade coordenadora, a Dirección General de Arquitectura y Calidad de la Edificación, que faz parte da Junta de Extremadura, Espanha.

 

 

Trata-se do projecto ReNaturalNZEB, financiado pelo programa europeu LIFE, e tem como objectivo “desenvolver edifícios de consumo de energia quase nulos com baixa pegada de carbono e baixo custo, usando materiais e produtos naturais e reciclados, através da introdução de tecnologias de construção sustentável”, refere Ana Paula Duarte, responsável pelo ReNaturalNZEB no LNEG.

Para isso, estão a ser desenvolvidas “quatro experiências de demonstração que combinam diferentes tipos de edifícios e situações construtivas, para habitação social e edifícios públicos” em Espanha, cujo trabalho se irá prolongar até Março de 2024. O objectivo é verificar o real impacto do uso de materiais naturais e reciclados e dar um exemplo que possa ajudar na divulgação e disseminação destas práticas.

Já em Portugal, com o trabalho finalizado, foram realizadas simulações numa moradia unifamiliar e geminada, situada em Beja, numa zona climática semelhante à de Espanha. Foram feitas simulações com materiais naturais – aglomerado negro de cortiça, lã de ovelha, Kenaf (uma planta herbácea anual), casca de arroz e lã de rocha – e, em termos construtivos, avaliaram-se as seguintes modalidades: construção padrão em Portugal, CLT (Cross Laminated Timber), Light Stell Frame, Taipa e BTC (Blocos de Terra Comprimida).

 

BALANÇO POSITIVO APONTA PARA VIABILIDADE DESTAS SOLUÇÕES

 

Em Portugal, “o balanço é muito positivo”, diz Paula Duarte, explicando que foi possível explorar, através da ferramenta de simulação, estes vários cenários com materiais distintos. Várias das metas propostas foram alcançadas. As necessidades de aquecimento e arrefecimento foram restringidas a, no máximo 15 kWh/m2 por ano, e foi possível reduzir em mais de 60 % a energia incorporada e as emissões de CO2 – com CLT, foi possível diminuir a energia incorporada em 85 % e, com LSF, foi possível diminuir as emissões de CO2 em 95 %.

Já quanto à redução do peso do edifício em pelo menos 20 %, a meta é alcançada apenas quando há intervenções não só a nível de isolamento e janelas, mas também da estrutura do edifício. A redução de resíduos para metade, que também era um objectivo, não é tão clara: “Não foi possível chegar ao valor exacto”, uma vez que não se trata de uma construção real, explica Paula Duarte, salvaguardando, no entanto, que o potencial é real.

A questão dos preços é um dos maiores desafios. A ideia era que os custos com o recurso a materiais naturais não representassem um aumento de mais de 25 % em relação à média actual com o padrão utilizado na indústria da construção. “Considerando a adopção de materiais naturais no isolamento, janelas e na estrutura do edifício, o custo de construção aumenta significativamente”, afirma a investigadora do LNEG. Isto acontece, sobretudo, “devido a factores externos que têm vindo a aumentar os custos dos materiais”, esclarece, apontando para a guerra e para o aumento do custo com transportes como exemplos.

No entanto, a conclusão do trabalho desenvolvido em Portugal é de que, adaptando a escolha dos materiais e métodos construtivos à zona climática do local, à orientação do edifícios, bem como aos recursos locais e às metas objectivadas, a “adopção de soluções baseadas na natureza para redução das necessidades energéticas no ambiente construído é uma alternativa às soluções tradicionais de construção nova e reabilitação”.

 

RENATURALNZEB DISPONIBILIZA MANUAL PARA AUXILIAR A ESCOLHA

 

Para auxiliar a escolha dos materiais, o projecto ReNaturalNZEB disponibilizou ainda, neste mês, um manual com directrizes e indicações sobre as vantagens e desvantagens dos diferentes materiais e isolamentos térmicos existentes no mercado, referindo também estudos e empresas fabricantes. O manual está disponível em formato digital em português e espanhol, podendo ser descarregado aqui

Além deste manual, também há outros disponíveis em espanhol que decorrem desta iniciativa, nomeadamente o Manual de materiais naturais na construção, o Manual de uso e caracterização de materiais tradicionais: terra, pedra e argamassa, e o Manual de projecto bioclimático de edifícios. Estes estão disponíveis para download aqui.